terça-feira, 29 de junho de 2010

vazio


E vinha depois também, insinuada aos poucos no meio da manhã, uma vontade de que alguém telefonasse, tocasse a campainha, chamasse lá embaixo, a princípio vaga, mas cada vez mais nítida, até chegar quase a ferir, feito uma dor, agulha, brasa. Nada acontecia. Aquela como uma vontade de ser feliz, de haver alguma ordem ou estar noutro lugar onde fosse possível sentar ao sol comendo maçãs, deixava também de ser como um estar-à-beira-de-qualquer-coisa-boa. Campainha e telefone mudos, a manhã a transformar-se em tarde, emergia venenosa a sufocação, vontade de fugir, de não ser quem era nem ter vivido nenhuma das coisas que vivera. Todo um passado, essa coisa que chamam de passado, desembocava ali naquele momento, em pleno centro das manhãs esbranquiçadas de silêncio.
– Caio 3D: O essencial da década de 1990 - Caio Fernando Abreu

Rancor


Vincent Van Gogh
Upload feito originalmente por musiciennedusilence

sentei hoje em frente ao pc para fazer o artigo que o Venturelli pediu sobre um conto do Marçal Aquino, percebi que não tinha o texto e fui pesquisar na internet... seria perfeito se algumas coisas fossem ao contrário...
Enfim, segue ele logo abaixo:

RANCOR - Marçal Aquino

(Polaroid n° 49)

Estavam naquela fase em que um faz tudo para conquistar o ódio do outro, na esperança de que algo intenso volte a pulsar entre os dois.
Tinham se amado muito, eu sabia. A maior paixão que vi.
Ela me contou que às vezes se imaginava bem velha, feliz, ou pelo menos esclerosadamente satisfeita da vida, mas não o via ao seu lado. E que era incapaz de prever como ele ficaria na velhice, porque tinha certeza de que não estaria por perto para ver. Uma ironia. Segundo ela, a maior declaração de amor dele: "Quero envelhecer junto de você".
Fotógrafa. No início, ele achava divertido esse lado dela: artista. Com o talento chancelado por meia dúzia de prêmios e exposições. Depois passou a considerar suspeitas as fotos que, aos conjuntos, estavam espalhadas pelos cômodos da casa—até no banheiro. Sempre paisagens. Nenhuma pessoa. Jamais um rosto ou corpo provocara um disparo da velha Canon que ela costumava usar. Ele me disse: "Sabe aquele tipo de cena fajuta, que você fica com a impressão de que a natureza posou para o fotógrafo e ainda recebeu por isso?"
Ele fizera um filme aos 22 anos. Amado pela crítica, ignorado pelo público. A partir daí, mergulhou na publicidade e colecionou prêmios. Falou-se muito sobre um roteiro, que ele nunca deu por concluído. Virou lenda no meio. "Só vinte e poucas páginas de anotações", ela me disse, explicando por que deixara de respeitá-lo. Não levava a sério pessoas que abandonam o sonho para ganhar dinheiro. Ou, como disse seu analista, ela não conseguia amar homens que deixara de admirar.
Aí teve o caso dele com a modelo. Exageraram: apareceram até numa coluna social. (Eu estava fora do Brasil nessa época.) "Uma prostitutazinha anoréxica", de acordo com ela. Retaliou: saiu com um amigo do casal, depois de uma festa. Não deu sorte: o cara não funcionou, culpou o uísque. Ela: "Eu procurando alguém que me desejasse e encontro um homem que me respeitava demais".
"Só em filmes medíocres e nas novelas da televisão as pessoas que se amam terminam juntas. Na vida real é o contrário: quem fica junto são as pessoas que não se amam", ele me disse. "Amar é passar a temer o futuro", ela me disse.
Mas se amaram.
Peço a ela uma lista com dez coisas boas dele.
Ela enumera:
1—seu cheiro
2—sua gentileza
3—seu senso de justiça
4—sua generosidade
5—seu bom-gosto musical
6—seu lado místico
7—sua inteligência
8—sua originalidade ao presentear
9—sua paixão por filmes antigos
10—seu pau
"Quer mais?", ela pergunta.
Amava os desertos. Uma vez fotografou um, na Líbia. Nenhum beduíno ou camelo. Parecia a mesma foto repetindo diversas vezes a areia em ondas douradas. Ele: "Os desertos dela são interiores. Lá, as tempestades de areia costumam durar meses".
Perguntei a ele sobre as coisas que a lembravam.
Antes de responder, ele olhou para o vaso sobre a mesa de centro entre nós: flores sinistras. "Dez? Basta olhar para ela e você vai encontrar bem mais de dez coisas."
Ela está apoiada na janela, olhando a noite. Sem roupa. Observo seu corpo: mesmo na penumbra, bem mais de dez coisas para um sujeito lembrar-se por um bom tempo.
Ao virar-se para me sorrir, seu perfil se enquadra contra o céu escuro. Sardas no rosto. Constelações.

quarta-feira, 23 de junho de 2010

quase no fim!


Eu sei, deveria estar em pânico (e estou) só tenho mais 2 dias de aula! Confesso que hoje no ônibus estava ouvindo uma música da Julieta Venegas que falava sobre partir e meus olhos encheram de água... não é fácil terminar um relacionamento de 7 anos! hahahahaha... passei esse tempo todo falando que estava no curso errado, que não me vejo trabalhando com isso e bla bla bla... mas agora, agora tá batendo uma saudadinha... vontade de ficar mais, mesmo não aguentando!
Enfim... ainda não entreguei a tal da monografia, tenho um saco de coisas para arrumar e quem sabe se eu virar um zumbi de madrugada consigo fechar com chave de ouro! Tirando isso... ótimas perspectivas para o segundo semestre e para 2011! Mas a única notícia que eu estava e ainda estou esperando não veio...
Bom... o post na verdade era pra contar sobre Campinas, hahaha... não consigo me concentrar ultimamente...
Tá, Campinas... sábado, 19 de junho, fui para lá fazer uma Oficina de Redação na Unicamp, foi ótima! E sinceramente não sei se a oficina foi melhor ou a viagem! Foi muito bom poder sair daqui um pouco, dar uma espairecida... a cidade não é aquelas coisas, achei feia na verdade, mas é sempre bom conhecer outros lugares... falando em lugares, quando estava indo pegar o ônibus para ir até o aeroporto, passei pela catedral de lá, entrei para dar uma fuçada e tirar fotos, claro! Quando me virei para tirar foto de um vitral um senhor puxou conversa, perguntando se eu sabia o que ia ter ali, porque tinha gente montando o som. Respondi que não era dali, que estava só conhecendo o lugar, de repente olho melhor para ele: gente, ele era igual, eu disse IGUAL ao meu avô! Foi muito estranho isso tudo! Aí chego aqui, comento com a minha mãe e ela me diz que nesse dia fez 4 anos que meu avô faleceu! Eu hein! Conversei um pouco mais com o senhor com a intenção de matar saudade do meu avô e fui embora, torcendo para que eu não estivesse falando sozinha ao olhar das pessoas que estavam ali, hehehe...
Ai ai... era isso... um post meio jogado sem pé nem cabeça... usei isso como pretexto para não mexer agora na monografia, hahaha... ok, não tem jeito... vou lá... ler Fiorin, Perini etc etc etc...

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Saramago

Estava eu no meu único dia de sono prolongado quando minha mãe abre a porta do quarto: “Ju, você tá com a TV ligada? Aquele escritor que você gosta morreu!”
Dei um salto da cama e liguei a TV para confirmar a notícia. Sim, estava ali na parte inferior da tela “morre, aos 87 anos, o escritor português José Saramago”, não consegui conter uma gotinha escorrendo no canto do olho direito.
Fiquei pensando no que poderia fazer para prestar uma singela homenagem, afinal de contas nosso caso de amor dura há pelo menos 12 anos!
Conheci o escritor lá pelos meus 15 anos numa aula de português. Íamos ter um feriado longo e a tarefa foi ler Ensaio Sobre a Cegueira e entregar uma resenha sobre o livro. Depois de criticar o preço do livro, minha mãe o comprou e fomos para a praia. Passei o dia todo da sala para o quarto, do quarto para a rede… com o livro nas mãos e só parei quando completei aquelas 312 páginas. Lembro perfeitamente que fechei o livro e fiquei em silêncio pensando em cada palavra usada, perguntando-me por que ele só usava pontos e vírgulas, como ele teria pensado em tudo aquilo? No dia seguinte li novamente no intento de apreender mais coisas que não havia apreendido na primeira leitura.
Depois desse primeiro contato, foi paixão à primeira vista! Quem sabe ele foi o culpado por eu ter escolhido cursar Letras, culpado também por eu ter esse olhar que tenho hoje, afinal de contas, a literatura nos faz mudar o olhar sobre o mundo.
Enfim… como parte do que sou hoje, é uma honra poder dizer que esse escritor português teve um papel importante na minha vida, e é com essa culpa que faço a humilde homenagem ao José Saramago, pois creio que a proposta de um escritor é de poder perturbar, fazer pensar os seus leitores, e se essa era a ideia do Saramago, comigo funcionou direitinho!

Na foto alguns dos seus livros, todos maravilhosos! E o Ensaio Sobre a Cegueira onde está? Está com uma amiga minha… espero sinceramente que cause nela o mesmo efeito que causou em mim.

quinta-feira, 17 de junho de 2010

sobre literatura

"Hoje, se me pergunto por que amo a literatura, a resposta que me vem espontaneamente à cabeça é: porque ela me ajuda a viver. Não é mais o caso de pedir a ela, como ocorria na adolescência, que me preservasse das feridas que eu poderia sofrer nos encontros com pessoas reais; em lugar de excluir as experiências vividas, ela me faz descobrir mundos que se colocam em continuidade com essas experiências e me permite melhor compreendê-las. Não creio ser o único a vê-la assim. Mais deusa e mais eloquente que a vida cotidiana, mas não radicalmente diferente, a literatura amplia o nosso universo, incita-nos a imaginar outras maneiras de concebê-lo e organizá-lo. Somos todos feitos do que os outros seres humanos nos dão: primeiro nossos pais, depois aqueles que nos cercam; a literatura abre ao infinito essa possibilidade de interação com os outros e, por isso, nos enriquece infinitamente. Ela nos proporciona sensações insubstituíveis que fazem o mundo real mais pleno de sentido. Longe de ser simples entretenimento, uma distração reservada às pessoas educadas, ela permite que cada um responda melhor à sua vocação de ser humano."
A Literatura em Perigo, T. Todorov - ed. Difel/09 p.23-24
 
Na aula de hoje o Paulo Venturelli escreveu esse trecho do Todorov e disse que era para refletirmos... não sei se é porque o curso está acabando finalmente, ou se através desse texto eu finalmente me achei em vários sentidos, o que interessa é que achei perfeito! Enjoy!

quarta-feira, 16 de junho de 2010

Bloomsday!

Aos amantes de literatura... hoje é comemorado o Bloomsday!

O Bloomsday é um feriado comemorado em 16 de junho na Irlanda em homenagem ao livro Ulisses, de James Joyce. É o único feriado em todo o mundo dedicado a um livro, excetuando-se a Bíblia.
O Bloomsday é comemorado na Irlanda e pelos amantes da literatura com diversos eventos oficiais e não oficiais. Também é comemorado todos os anos em vários lugares e em várias línguas. Em comum entre os muitos dedicados entusiastas e simpatizantes envolvidos nestas comemorações há o esforço por relembrar os acontecimentos vividos pelos personagens de Ulisses pelas dezenove ruas da cidade de Dublin.
Ulisses relata a odisséia do personagem Leopold Bloom durante 16 horas do dia 16 de junho de 1904 e é considerada um dos marcos da literatura contemporânea ocidental.
Há certa controvérsia sobre quando o Bloomsday começou a ser de fato comemorado. Alguns especialistas indicam 1925, três anos após o lançamento do livro, outros que foi na década de 1940, logo após a morte de James Joyce, enquanto a hipótese mais aceita indica que foi em 1954, na data do quinquagésimo aniversário do dia retratado em Ulisses.
Hoje o Bloomsday é uma efeméride inserida no calendário cultural de vários países que não é nem um pouco restrita ao círculo dos leitores das cerca de 900 páginas da obra Ulisses. É uma festa que pode acontecer em qualquer lugar onde se leia ou se discuta James Joyce e o Ulisses.
Texto extraído da Wikipédia 

Em Curitiba, está sendo comemorado no 11º da reitoria da UFPR, o evento começou às 14h e vai até às 18h30 + ou -... podendo ser prolongado para algum lugar com cerveja irlandesa!

Eu não sou fã da Wikipédia, mas até que explicou direitinho o que é esse dia =]


segunda-feira, 14 de junho de 2010

Leite Derramado

Preu não me sentir sozinha enquanto escrevo o trabalho sobre romance histórico, vai uma resenha que fiz sobre o livro...


Leite Derramado, Chico Buarque
 
Juliana Cristina da Silva

 
            Eulálio Montenegro D`Assumpção (sem pronunciar o “p” mudo para não causar deboche) é o protagonista do novo romance de Chico Buarque, Leite Derramado, publicado pela Companhia das Letras.
            Este senhor com pouco mais de 100 anos, encontra-se em um leito de hospital, de onde narra suas memórias e pensamentos, nem sempre cronológicos, seja porque sua memória já o confunde ou por estar sob efeitos dos medicamentos, por isso muitas vezes na obra aparece: “Não sei se já lhes contei alguma vez como conheci Matilde na missa do meu pai...”; as pessoas para quem ele conta os fatos são as enfermeiras, sua filha ou apenas divagações.
            Dentro desse emaranhado de pensamentos e lembranças nos damos conta de aspectos da história do Brasil, dos acontecimentos na sociedade do Rio de Janeiro do século passado, falar em francês na presença dos empregados, por exemplo, e até mesmo feitos dos familiares desse ancião na Europa. A partir do “quebra-cabeça histórico” apresentado, podemos encontrar referência à vinda da família real portuguesa, com a qual veio o seu trisavô, à belle épóque, à Segunda Guerra Mundial, à quebra da bolsa de Nova Iorque e à ditadura militar. Todos esses fatos nos são narrados para lembrar da importância do seu sobrenome perante a sociedade que aos poucos, com a vinda dos netos, bisnetos e tataranetos vai tornando-se cada vez menos importante, pois antigamente era um sobrenome que lhes abriam portas e agora no presente não influencia em mais nada.
            Chico Buarque, através do apanhado de informações, faz uso muito refinado da linguagem, usando flash-backs não-lineares, confundindo o leitor e inserindo a temática do racismo com sutileza, como por exemplo a Matilde que é descrita como “a mais escurinha das irmãs” ou o seu desejo sobre o seu colega filho de escravo.
            Sob meu olhar de leitora, este romance está próximo ao Budapeste, com histórias e personagens diferentes, claro, mas com uma certa aproximação na vida das personagens, ambos estão “perdidos”, ou melhor, em algum tipo de decadência, e próximo também ao Estorvo, pela descrição das cenas no Rio de Janeiro. Quanto à forma da linguagem, certamente Chico Buarque cresceu muito neste, Leite Derramado, pois ele consegue prender o leitor durante toda a narrativa, talvez pela empatia que o velho Eulálio nos causa ao contar sobre sua amada Matilde, mas principalmente pelo primor da escrita, na maioria das vezes parecendo fluxo de consciência, e aí está o primor da obra, Chico consegue fazer uso da linguagem como poucos, prendendo e confundindo o leitor na narrativa, mas sem que ele tenha se perdido ao elaborar a obra.
            Com as características apontadas sobre traços históricos, outro traço que podemos destacar na obra é o traço psicológico do protagonista, a partir das descrições e lembranças dele, é possível analisar a falta que fez uma estrutura familiar, o quanto o deixou perdido as viagens com o pai para a Europa e a aproximação das moças nas sofisticadas suítes dos hotéis, conhecer a neve das montanhas etc. Creio que também o que marca psicologicamente o protagonista é a presença/ausência de Matilde, presente sempre em suas memórias, mas ausente a partir de alguns acontecimentos e é quando Eulálio relembra da amada que seus pensamentos se confundem.
            Vale a pena dedicar alguns momentos para conhecer melhor esse velho saudosista e se perder entre as palavras derramadas nesse novo romance do Chico Buarque.


segunda-feira, 7 de junho de 2010

sobre fotografia

alegria - joy

Tirar fotos é prender a respiração quando todas as faculdades convergem para a realidade fugaz. É organizar rigorosamente as formas visuais percebidas para expressar o seu significado. É pôr numa mesma linha de mira a cabeça, o olho e o coração.”
Henri Cartier-Bresson

domingo, 6 de junho de 2010

Dia do Reclame!!!!!

Seguindo a ideia da Moni, vou fazer de segunda (07.06) o dia do Reclame também!
Moni! Apoiada sua ideia!

Aguardem os reclames!

sábado, 5 de junho de 2010

devaneios....

... hoje passei a tarde escrevendo a monografia, nem acredito que o pior já passou, ainda tenho os arremates, mas ufa!
Bem... queria escrever tanta coisa, mas no fundo não queria divulgar para o espaço cibernético e também para quem quero escrever não cabe aqui... enfim... muita coisa tem passado pela caixola, pelo cuore, pelas borboletas no estômago e não tem sido nada fácil... altos ataques de histeria, coisas acontecendo à noite, tremedeira, enfim... só posso escrever uma coisa: _ você tinha razão sobre as drogas (acho que só ele vai entender isso, hehe), não posso ficar sem elas!
whatever... quem sabe um dia a neblina vai embora e tudo fica bem de novo...

quinta-feira, 3 de junho de 2010

por isso gosto dele...

Suas palavras sempre vêem em boa hora!

Momentos
Junho 4, 2010 por Fundação José Saramago

Há momentos assim na vida: descobre-se inesperadamente que a perfeição existe, que é também ela uma pequena esfera que viaja no tempo, vazia, transparente, luminosa, e que às vezes (raras vezes) vem na nossa direcção, rodeia-nos por breves instantes e continua para outras paragens e outras gentes.
In Manual de Pintura e Caligrafia, Ed. Caminho, 6.ª ed., p. 291 (Selecção de Diego Mesa)